POEMINHA SENTIMENTAL
Mario Quintana
O meu amor, o meu amor, Maria
É como um fio telegráfico da estrada
Aonde vêm pousar as andorinhas...
De vez em quando chega uma
E canta
(Não sei se as andorinhas cantam, mas vá lá!)
Canta e vai-se embora
Outra, nem isso,
Mal chega, vai-se embora.
A última que passou
Limitou-se a fazer cocô
No meu pobre fio de vida!
No entanto, Maria, o meu amor é sempre o mesmo:
As andorinhas é que mudam.
Por acaso, surpreendo-me no espelho:
mario quintana
Quem é esse que me olha e é tão mais velho que eu? (...)
Parece meu velho pai - que já morreu! (...)
Nosso olhar duro interroga:
"O que fizeste de mim?" Eu pai? Tu é que me invadiste.
Lentamente, ruga a ruga... Que importa!
Eu sou ainda aquele mesmo menino teimoso de sempre
E os teus planos enfim lá se foram por terra,
Mas sei que vi, um dia - a longa, a inútil guerra!
Vi sorrir nesses cansados olhos um orgulho triste..."
Por favor não me analise,
Mario Quintana
Não fique procurando cada ponto fraco meu.
Se ninguém resiste a uma análise profunda.
Quanto mais eu, ciumento, exigente, inseguro, carente,
Todo cheio de marcas que a vida deixou.
Vejo em cada grito de exigência
Um pedido de carência, um pedido de amor
Por que será que a gente vive chorando os amigos mortos e não agüenta os que continuam vivos?
Mário Quintana
Qual Ioga, qual nada! A melhor ginástica respiratória que existe é a leitura, em voz alta, dos Lusíadas.
Mário Quintana
Qualquer ideia que te agrade,
Mário Quintana
Por isso mesmo... é tua.
O autor nada mais fez que vestir a verdade
Que dentro em ti se achava inteiramente nua...
PRESENÇA
Mário Quintana
É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,
teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento
das horas ponha um frêmito em teus cabelos...
É preciso que a tua ausência trescale
sutilmente, no ar, a trevo machucado,
as folhas de alecrim desde há muito guardadas
não se sabe por quem nalgum móvel antigo...
Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela
e respirar-te, azul e luminosa, no ar.
É preciso a saudade para eu sentir
como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida...
Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista
que nunca te pareces com o teu retrato...
E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.
Quando abro a cada manhã a janela do meu quarto
Mário Quintana
É como se abrisse o mesmo livro
Numa página nova...
Quando eu for, um dia desses,
Mário Quintana
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso
Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)
E talvez de meu repouso...
Quando guri, eu tinha de me calar, à mesa: só as pessoas grandes falavam. Agora, depois de adulto, tenho de ficar calado para as crianças falarem.
Mário Quintana
Que importa restarem cinzas se a chama foi bela e alta?
Mário Quintana
Quem dera eu achasse um jeito
Mário Quintana
de fazer tudo perfeito,
feito a coisa fosse o projeto
e tudo já nascesse satisfeito
Quem disse que eu me mudei?
Mário Quintana
Não importa que a tenham demolido:
A gente continua morando na velha casa em que nasceu.
Quem faz um poema abre uma janela.
Mário Quintana
Respira, tu que estás numa cela abafada,
esse ar que entra por ela.
Por isso é que os poemas têm ritmo
- para que possas profundamente respirar.
Quem faz um poema salva um afogado.
Quem não compreende um olhar, tampouco compreenderá uma longa explicação.
Mario Quintana
Quem pretende apenas a glória não a merece.
Mário Quintana
Queria ter a certeza de que apesar de minhas renúncias e loucuras, alguém me valoriza pelo que sou, não pelo que tenho...Que me veja como um ser humano completo, que abusa demais dos bons sentimentos que a vida lhe proporciona, que dê valor ao que realmente importa, que é meu sentimento...e não brinque com ele.E que esse alguém me peça para que eu nunca mude, para que eu nunca cresça, para que eu seja sempre eu mesmo.Não quero brigar com o mundo, mas se um dia isso acontecer, quero ter forças suficientes para mostrar a ele que o amor existe...Que ele é superior ao ódio e ao rancor, ...................................................................Que eu nunca deixe minha esperança ser abalada por palavras pessimistas...
Mário Quintana
Quero todo o teu espaço
Mario Quintana
e todo o teu tempo.
Quero todas as tuas horas
e todos os teus beijos.
Quero toda a tua noite
e todo o teu silêncio.
Quiseste expor teu coração a nu.
Mário Quintana
E assim, ouvi-lhe todo o amor alheio.
Ah, pobre amigo, nunca saibas tu
Como é ridículo o amor... alheio!
RECORDO AINDA
Mario Quintana
Recordo ainda... e nada mais me importa...
Aqueles dias de uma luz tão mansa
Que me deixavam, sempre, de lembrança,
Algum brinquedo novo à minha porta...
Mas veio um vento de Desesperança
Soprando cinzas pela noite morta!
E eu pendurei na galharia torta
Todos os meus brinquedos de criança...
Estrada afora após segui... Mas, aí,
Embora idade e senso eu aparente
Não vos iludais o velho que aqui vai:
Eu quero os meus brinquedos novamente!
Sou um pobre menino... acreditai!...
Que envelheceu, um dia, de repente!...
Reflexão de Lavoisier ao descobrir que lhe haviam roubado a carteira: nada se perde, tudo muda de dono.
Mário Quintana
Se alguém te perguntar o que quiseste dizer com um poema, pergunta-lhe o que Deus quis dizer com este mundo...
Mario Quintana
Se eu amo o meu semelhante? Sim. Mas onde encontrar o meu semelhante?
Mário Quintana
Se eu fosse acreditar mesmo em tudo o que eu penso, ficaria louco.
Mário Quintana
Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
Mário Quintana
não falaria em Deus nem no Pecado
— muito menos no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,
não citaria santos e profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,
Rezaria seus versos, os mais belos,
desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!
Porque a poesia purifica a alma
...e um belo poema — ainda que de Deus se aparte —
um belo poema sempre leva a Deus!