...há impossibilidade de ser além do que se é -
Clarice Lispector
no entanto eu me ultrapasso mesmo sem o delírio,
sou mais do que eu, quase normalmente -
tenho um corpo e tudo que eu fizer é continuação
de meu começo......
a única verdade é que vivo.
Sinceramente, eu vivo.
Quem sou? Bem, isso já é demais...
...nada jamais fora tão acordado como seu corpo sem transpiração e seus olhos-diamantes,
Clarice Lispector
e de vibração parada.
E o Deus? Não.
Nem mesmo a angustia. O peito vazio, sem contração. Não havia grito.
...Que minha solidão me sirva de companhia.
Clarice Lispector
que eu tenha a coragem de me enfrentar.
que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir
como se estivesse plena de tudo.
...sua sensibilidade incomodava sem ser dolorosa, como uma unha quebrada.
Clarice Lispector
e se quisesse podia permitir-se o luxo de se tornar ainda mais sensível,
ainda podia ir mais adiante...
A direção é mais importante do que a velocidade.
Clarice Lispector
À duração da minha existência dou uma significação oculta que me ultrapassa. Sou um ser concomitante: reúno em mim o tempo passado, o presente e o futuro, o tempo que lateja no tique-taque dos relógios.
Clarice Lispector
A feiúra é o meu estandarte de guerra. Eu amo o feio com um amor de igual para igual.
Clarice Lispector
in Água Viva
A felicidade aparece para aqueles que choram.
Clarice Lispector
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
A gente escreve como quem ama.
Clarice Lispector
...sentou-se para descansar e em breve fazia de conta que ela era uma mulher azul porque o crepúsculo mais tarde talvez fosse azul, faz de conta que fiava com fios de ouro as sensações, faz de conta que a infância era hoje e prateada de brinquedos, faz de conta que uma veia não se abrira e faz de conta que que dela não estava em silêncio alvíssimo escorrendo sangue escarlate, e que ela não estivesse pálida de morte mas isso fazia de conta que estava mesmo de verdade, precisava no meio do faz de conta falar a verdade de pedra opaca para que contrastasse com o faz de conta verde-cintilante, faz de conta que amava e era amada, faz de conta que não precisava de morrer de saudade, faz de conta que estava deitada na palma transparente da mão de Deus,..., faz de conta que vivia e que não estivesse morrendo pois viver afinal não passava de se aproximar cada vez mais da morte, faz de conta que ela não ficava de braços caídos de perplexidade quando os fios de ouro que fiava se embaraçavam e ela não sabia desfazer o fino fio frio, faz de conta que era sábia bastante para desfazer os nós de corda de marinheiro que lhe atavam os pulsos, faz de conta que tinha um cesto de pérolas só para olhar a cor da lua pois ela era lunar, faz de conta que ela fechasse os olhos e os seres amados surgissem quando abrisse os olhos úmidos de gratidão, faz de conta que tudo o que tinha não era faz de conta, faz de conta que se descontraía o peito e a luz douradíssima e leve a guiava por uma floresta de açudes mudos e de tranqüilas mortalidades, faz de conta que ela não era lunar, faz de conta que ela não estava chorando por dentro...
Clarice Lispector
A lucidez perigosa
Clarice Lispector
Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.
Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.
Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
- já me aconteceu antes.
A Lucidez Perigosa
Clarice Lispector
Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
Assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.
Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.
Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
- já me aconteceu antes.
Pois sei que
- em termos de nossa diária
e permanente acomodação
resignada à irrealidade -
essa clareza de realidade
é um risco.
Apagai, pois, minha flama, Deus,
porque ela não me serve para viver os dias.
Ajudai-me a de novo consistir
dos modos possíveis.
Eu consisto,
eu consisto,
amém.
A minha única salvação é a alegria. (Água Viva)
Clarice Lispector
A minha vida a mais verdadeira é irreconhecível, extremamente interior e não tem uma só palavra que a signifique.
Clarice Lispector
Clarice Lispector, in A Hora da Estrela
A palavra é o meu domínio sobre o mundo.
Clarice lispector
A Perfeição
Clarice Lispector
O que me tranqüiliza
é que tudo o que existe,
existe com uma precisão absoluta.
O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete
não transborda nem uma fração de milímetro
além do tamanho de uma cabeça de alfinete.
Tudo o que existe é de uma grande exatidão.
Pena é que a maior parte do que existe
com essa exatidão
nos é tecnicamente invisível.
O bom é que a verdade chega a nós
como um sentido secreto das coisas.
Nós terminamos adivinhando, confusos,
a perfeição.
A poesia dos poetas que sofreram é doce e terna. E a dos outros, dos que de nada foram privados, é ardente, sofredora e rebelde.
Clarice Lispector
A violeta é introvertida e sua introspecção é profunda.Dizem que se esconde por modéstia.Não é.Esconde-se para poder captar o próprio segredo.Seu quase-não-perfume é glória abafada mas exige da gente que
Clarice Lispector
o busque.Não grita nunca seu perume.Violeta diz levezas que não se podem dizer.
Acho que sábado é a rosa da semana.
Clarice Lispector
Ah, e dizer que isto vai acabar, que por si mesmo não pode durar. Não, ela não está se referindo ao fogo, refere-se ao que sente. O que sente nunca dura, o que sente sempre acaba, e pode nunca mais voltar. Encarniça-se então sobre o momento, come-lhe o fogo, e o fogo doce arde, arde, flameja. Então, ela que sabe que tudo vai acabar, pega a mão livre do homem, e ao prendê-la nas suas, ela doce arde, arde, flameja.
Clarice Lispector
in "Onde estivestes de noite" - 7ª Ed. - Ed. Francisco Alves - Rio de Janeiro – 1994
Amanheci em cólera. Não, não, o mundo não me agrada. A maioria das pessoas estão mortas e não sabem, ou estão vivas com charlatanismo. E o amor, em vez de dar, exige. E quem gosta de nós quer que sejamos alguma coisa de que eles precisam. Mentir dá remorso. E não mentir é um dom que o mundo não merece...
Clarice Lispector
Amar os outros é a única salvação individual que conheço: ninguém estará perdido se der amor e às vezes receber amor em troca.
Clarice Lispector
Clarice Lispector
Amor é quando é concedido participar um pouco mais.
Clarice Lispector
Amor é a grande desilusão de tudo mais.
Amor é finalmente a pobreza.
Amor é não ter inclusive amor.
É a desilusão do que se pensava que era amor.
Amor não é prêmio por isso não envaidece.
Amor será dar de presente a outro a própria solidão?
Clarice Lispector
Pois é a coisa mais última que se pode dar de si.
As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas.
Clarice Lispector
Elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos.