Jorge Reigada: Se você pensa que te amei, te enganei, me enganei



Se você pensa que te amei, te enganei, me enganei.

Trapaceiro de mim, me visto paixão, ardor, amor.

Meus olhos apenas imitam os seus. Muito eu sinto, mas minto.

Minha alma não se desnuda. Analisa, estuda e não muda.



Sou obra da arte do medo, do enredo sem sorte, sem norte.

Figura camaleoa, que mostra as várias faces ao léu, a toa.

Direi o que desejas escutar para que se apegue e se negue.

Pra você quero ser tudo, seus desejos, sua alma, sua palma.



Mas não me entrego, finjo, disfarço. Sem calor sou mormaço.

Com muitas palavras, mas sem ação, quero você como um cão.

Se te acarinho com os pés, não é paixão nem devoção, é pisão.

Não converso, conduzo, pesquiso. Sério, não te dou meu riso.



Se você pensa que te amei, te enganei, me enganei.

Não amo, domino, este é o meu destino. Sem tino, desatino.

Sem indulto, de tudo te culpo. Eu? Sou direito, perfeito.

Herói, verdadeiro, forte, grandioso. Não creia, sou mentiroso.



Se te abraço é para roubar de ti o sentimento, pois não agüento.

Minha vida vazia me angustia, aterroriza, martiriza.

Fico feliz com suas lágrimas, satisfazem a doença, minha crença.

Se eu chorar, duvide é falso, eu sou o ator de amor.



Direi mil vezes que te amo, mas te engano, sou insano, profano.

Seu corpo, seu dote onde coloco o garrote, focinheira, coleira.

Teus olhos só enxergarão minha sombra. Sem luz, serei tua cruz.

Sou a razão, de tua dor, tua alegria, mas com grilhões e sem alforria.



Eu não amo, possuo e para possuir, se preciso for, destruo.

Mostrarei todos os teus defeitos, quero que medite e acredite.

Que sou bom e o único que te aceita assim tão imperfeita.

Eu sou doente, estou no fosso, mas mostro o cume, sinto ciúme.



Sou dominador e dominado, um pobre e cego coitado.

Vejo o mundo um perigo e me sinto sem abrigo, sem amigo.

Sem você para mandar, espoliar. Sou mendigo, refém, ninguém.

Do mesmo mármore você é escultura. Eu? Sem iso, sou o piso.



Eu não te amo, não sei amar. Moldura do nada que não acaba.

Segredo? Tenho medo, sou fraco, impuro, vivo no escuro.

E quando tua luz me cega, te invejo. Armadilha que me humilha.

Me ajude, te peço socorro. Eu morro a cada momento.

Por que? Eu sou ciumento.


Rio, 25 de março de 2003

Jorge Reigada

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