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No escuro do mundo.



Saudades de por vir, eu diria. E diria mais, mas é que agora a palavra engasga nos dedos, foge das mãos, afunda entre os seios, encrava e quase dói. Só não dói, diga-se, porque há muito fiz um acordo com o gume das palavras: elas se amolam em mim, mas me poupam de seu corte. Não tenho dormido o sono de apagar o mundo. Durmo com grandes olhos abertos sobre mim mesma, boiando afogada sobre o quarto, à procura de algo, uma fenda, um oco, uma ranhura que me escoe e absolva. Tenho medo de esquecer teu corpo, te disse? E para não te perder da memória, recito teus pedaços aos meus sentidos numa estranha tabuada e tenho medo de já lembrar do que não é, de já ter fabricado novas cores para os teus olhos, para as tuas mãos, de tu já seres metade reinvenção de mim mesma. (Eu deitei mesmo sobre o teu peito?) E quero desistir, às vezes. Muda e imóvel flutuando no escuro gelado da madrugada, abandonada de todo e em cada parte, quase recobro uma consciência outra que nunca tive onde eu te decifro e tu te apequenas até sumir, mas nem isso dói. O mais parecido com dor é mesmo essa saudade de tudo que eu não sei se conjugo no futuro ou no passado mais-que-perfeito.

Patricia Antoniete