O amor
V. Hugo
Pois que a beber me deste em taça transbordante,
e a fronte no teu colo eu tenho reclinado,
e respirei da tu'alma o hábito inebriante,
- Misterioso perfume à sombra derramado;
visto que te escutei tanto segredo, tanto!
Que vem do coração, dos íntimos refolhos,
e tive o teu sorriso e enxuguei o teu pranto,
- A boca em minha boca e os olhos nos meus olhos;
pois que um raio senti do teu astro, querida,
dissipar-me da fronte as densas brumas frias,
desde que vi cair na onda da minha vida
a pétala de rosa arrancada aos teus dias...
Possa agora dizer ao tempo em seus rigores:
- Não envelheço, não! podeis correr, sem calma,
levando na torrente as vossas murchas flores;
ninguém há de colher a flor que eu tenha n'alma!
Podeis com a asa bater, tentando, sem efeito,
a taça derramar em que me dessedento
Do que cinzas em vós há mais fogo em meu peito
e, em mim, há mais amor que em vós esquecimento
V. Hugo