"É menor pecado elogiar um mau livro sem o ler, do que depois de o ter lido. Por isso, agradeço imediatamente depois de receber o volume. Não há vida literária plenamente virtuosa."
Carlos Drummond de Andrade
[Carlos Drummond de Andrade]
"Escritor: não somente uma certa maneira especial de ver as coisas, senão também uma impossibilidade de as ver de qualquer outra maneira." [Carlos Drummond de Andrade]
"Cem frases que resumissem a sabedoria universal tornariam dispensáveis os livros." [Carlos Drummond de Andrade]
"Não é fácil ter paciência diante dos que têm excesso de paciência."
[Carlos Drummond de Andrade]
"Partido político é um agrupamento de cidadãos para defesa abstrata de princípios e elevação concreta de alguns cidadãos."
[Carlos Drummond de Andrade]
"A amizade é um meio de nos isolarmos da humanidade cultivando algumas pessoas." [Carlos Drummond de Andrade]
"A confiança é um ato de fé, e esta dispensa raciocínio."
[Carlos Drummond de Andrade]
"A leitura é uma fonte inesgotável de prazer mas por incrível que pareça, a quase totalidade, não sente esta sede."
[Carlos Drummond de Andrade]
"As dificuldades são o aço estrutural que entra na construção do caráter." [Carlos Drummond de Andrade]
"Há duas épocas na vida, infância e velhice, em que a felicidade está numa caixa de bombons." [Carlos Drummond de Andrade]
"Ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade."
[Carlos Drummond de Andrade]
"Só é lutador quem sabe lutar consigo mesmo."
[Carlos Drummond de Andrade]
"Ninguém é igual a ninguém. Todo o ser humano é um estranho ímpar." [Carlos Drummond de Andrade]
"Há muitas razões para duvidar e uma só para crer."
[Carlos Drummond de Andrade]
"Para a virtude da discrição, ou de modo geral qualquer virtude, aparecer em seu fulgor, é necessário que faltemos à sua prática." [Carlos Drummond de Andrade]
"Perder tempo em aprender coisas que não interessam, priva-nos de descobrir coisas interessantes." [Carlos Drummond de Andrade]
"Como as plantas a amizade não deve ser muito nem pouco regada."
[Carlos Drummond de Andrade]
"Há livros escritos para evitar espaços vazios na estante."
[Carlos Drummond de Andrade]
"As obras-primas devem ter sido geradas por acaso; a produção voluntária não vai além da mediocridade."
[Carlos Drummond de Andrade]
"A educação visa melhorar a natureza do homem o que nem sempre é aceite pelo interessado." [Carlos Drummond de Andrade]
"O cofre do banco contém apenas dinheiro. Frustar-se-á quem pensar que nele encontrará riqueza." [ Carlos Drummond de Andrade]
"Necessitamos sempre de ambicionar alguma coisa que, alcançada, não nos torna sem ambição." [Carlos Drummond de Andrade]
"Os homens são como as moedas; devemos tomá-los pelo seu valor, seja qual for o seu cunho." [Carlos Drummond de Andrade]
"Ah o amor... que nasce não sei onde, vem não sei como e dói não sei porque..." [Carlos Drummond de Andrade]
"... Não há falta na ausência. A ausência é um estar em mim. E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços, que rio e danço e invento exclamações alegres, porque a ausência assimilada, ninguém a rouba mais de mim." [Carlos Drummond de Andrade]
"Tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo..."
[Carlos Drummond de Andrade]
"Há vários motivos para não se amar uma pessoa e um só para amá-la."[Carlos Drummond de Andrade]
A bunda, que engraçada
Carlos Drummond de Andrade
A bunda, que engraçada.
Está sempre sorrindo, nunca é trágica.
Não lhe importa o que vai
pela frente do corpo. A bunda basta-se.
Existe algo mais? Talvez os seios.
Ora — murmura a bunda — esses garotos
ainda lhes falta muito que estudar.
A bunda são duas luas gêmeas
em rotundo meneio. Anda por si
na cadência mimosa, no milagre
de ser duas em uma, plenamente.
A bunda se diverte
por conta própria. E ama.
Na cama agita-se. Montanhas
avolumam-se, descem. Ondas batendo
numa praia infinita.
Lá vai sorrindo a bunda. Vai feliz
na carícia de ser e balançar
Esferas harmoniosas sobre o caos.
A bunda é a bunda
redunda.
A castidade com que abria as coxas
Carlos Drummond de Andrade
A castidade com que abria as coxas
e reluzia a sua flora brava.
Na mansuetude das ovelhas mochas,
e tão estreita, como se alargava.
Ah, coito, coito, morte de tão vida,
sepultura na grama, sem dizeres.
Em minha ardente substância esvaída,
eu não era ninguém e era mil seres
em mim ressuscitados. Era Adão,
primeiro gesto nu ante a primeira
negritude de corpo feminino.
Roupa e tempo jaziam pelo chão.
E nem restava mais o mundo, à beira
dessa moita orvalhada, nem destino.
A confiança é um ato de fé, e esta dispensa raciocínio.
Carlos Drummond de Andrade
A conquista da liberdade é algo que faz tanta poeira, que por medo da bagunça, preferimos, normalmente, optar pela arrumação.
Carlos Drummond de Andrade
A dor e inevitavél o sofrimento e opcional
Carlos Drummond de Andrade
A educação para o sofrimento, evitaria senti-lo, em relação a casos que não o merecem.
Carlos Drummond de Andrade
A educação visa melhorar a natureza do homem o que nem sempre é aceite pelo interessado.
Carlos Drummond de Andrade
A leitura é uma fonte inesgotável de prazer mas por incrível que pareça, a quase totalidade, não sente esta sede.
Carlos Drummond de Andrade
A liberdade é defendida com discursos e atacada com metralhadoras.
Carlos Drummond de Andrade
A língua lambe
Carlos Drummond de Andrade
A língua lambe as pétalas vermelhas
da rosa pluriaberta; a língua lavra
certo oculto botão, e vai tecendo
lépidas variações de leves ritmos.
E lambe, lambilonga, lambilenta,
a licorina gruta cabeluda,
e, quanto mais lambente, mais ativa,
atinge o céu do céu, entre gemidos,
entre gritos, balidos e rugidos
de leões na floresta, enfurecidos.
A minha vontade é forte, mas a minha disposição de obedecer-lhe é fraca.
Carlos Drummond de Andrade
A PROCURA DA POESIA
Carlos Drummond de Andrade
Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.
Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.
Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.
O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.
Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.
Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.
Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.
Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.
Adão, o primeiro espoliado - e no próprio corpo.
Carlos Drummond de Andrade
ainda assim te pergunto e me queimando em teu seio, me salvo e me dano: amor.
Carlos Drummond de Andrade
Ainda que mal
Carlos Drummond de Andrade
Ainda que mal pergunte,
ainda que mal respondas;
ainda que mal te entenda,
ainda que mal repitas;
ainda que mal insista,
ainda que mal desculpes;
ainda que mal me exprima,
ainda que mal me julgues;
ainda que mal me mostre,
ainda que mal me vejas;
ainda que mal te encare,
ainda que mal te furtes;
ainda que mal te siga,
ainda que mal te voltes;
ainda que mal te ame,
ainda que mal o saibas;
ainda que mal te agarre,
ainda que mal te mates;
ainda assim te pergunto
e me queimando em teu seio,
me salvo e me dano: amor.
ALÉM DA TERRA, ALÉM DO CÉU
Carlos Drummond de Andrade
Além da Terra, além do Céu,
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastro dos astros,
na magnólia das nebulosas.
Além, muito além do sistema solar,
até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!
vamos conjugar
o verbo fundamental essencial,
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempreamar,
o verbo pluriamar,
razão de ser e de viver.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
Carlos Drummond de Andrade
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita
Amor é bicho instruído
Carlos Drummond de Andrade
Olha: o amor pulou o muro
o amor subiu na árvore
em tempo de se estrepar.
Pronto, o amor se estrepou.
Daqui estou vendo o sangue
que escorre do corpo andrógino.
Essa ferida, meu bem
às vezes não sara nunca
às vezes sara amanhã.
Amor é dado de graça,é semeado no vento,na cachoeira, no eclipse.Amor foge a dicionários e a regulamentos vários.
Carlos Drummond
Amar
Carlos Drummond de Andrade
Que pode uma criatura senão,
senão entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.
Amor é privilégio de maduros
Carlos Drummond de Andrade
estendidos na mais estreita cama,
que se torna a mais larga e mais relvosa,
roçando, em cada poro, o céu do corpo.
É isto, amor: o ganho não previsto,
o prêmio subterrâneo e coruscante,
leitura de relâmpago cifrado,
que, decifrado, nada mais existe
valendo a pena e o preço do terrestre,
salvo o minuto de ouro no relógio
minúsculo, vibrando no crepúsculo.
Amor é o que se aprende no limite,
depois de se arquivar toda a ciência
herdada, ouvida. Amor começa tarde.
Carlos Drummond de Andrade
Ao Amor Antigo
Carlos Drummond de Andrade
O amor antigo vive de si mesmo,
não de cultivo alheio ou de presença.
Nada exige nem pede. Nada espera,
mas do destino vão nega a sentença.
O amor antigo tem raízes fundas,
feitas de sofrimento e de beleza.
Por aquelas mergulha no infinito,
e por estas suplanta a natureza.
Se em toda parte o tempo desmorona
aquilo que foi grande e deslumbrante,
a antigo amor, porém, nunca fenece
e a cada dia surge mais amante.
Mais ardente, mas pobre de esperança.
Mais triste? Não. Ele venceu a dor,
e resplandece no seu canto obscuro,
tanto mais velho quanto mais amor.
As academias coroam com igual zelo o talento e a ausência dele.
Carlos Drummond de Andrade
As coisas que amamos
Carlos Drummond de Andrade
as pessoas que amamos
são eternas até certo ponto.
Duram o infinito variável
no limite de nosso poder
de respirar a eternidade
Pensá-las é pensar que não acabam nunca,
dar-lhes moldura de granito.
De outra maneira se tornam absoluta
numa outra (maior) realidade.
Começam a esmaecer quando nos cansamos,
e todos nos cansamos, por um outro itinerário,
de aspirar a resina do eterno.*
Já não pretendemos que sejam imperecíveis.
Restituímos cada ser e coisa à condição precária
rebaixamos o amor ao estado de utilidade.
Do sonho eterno fica esse gozo acre
na boca ou na mente, sei lá, talvez no ar"