Menino levado a tona das cores
Zeca Preto
Filho de Macunáima
Neto da sensibilidade
Guerreiro amazônico da arte
Passeando de ubá com simplicidade.
Eu quero mesmo é ficar em casa
Zeca Preto
No aconchego das curvas de teu violão
Beijando essa boca fresca de hortelã
Quarando a madrugada pra te consumir.
Tomara que existam cores no teu pensamento
Zeca Preto
Tomara que exista madrugada no teu bocejo
E que seja verso cada esquina donde moras
Pra que a poesia se encalhe no refrão dessa canção.
Sinto falta dessa boca carnuda de acerola
Zeca Preto
Das curvas perigosas do teu corpo
Da vontade de beber em teu umbigo
O vinho menstrual de tua cólica.
Lembro da gente voltando da festa terminada
Zeca Preto
Em cambaleios abraçado a pessoa amada
Ouvia-se apenas os compassos de nossos passos
Que se harmonizavam com as cantigas
Que surgiam do silêncio romântico das estrelas
Que clareavam caminhos da minha cidade do interior.
Do gosto a explosão
Zeca Preto
Da água o coração
Do caroço a compreensão
É tempo de jambo.
Me guarde agasalhado no seu coração
Zeca Preto
Me balance, me fale da nossa canção
E penetra sua voz suave sem cessar
Bem no pé da minha nuca..
Abre a porta do quintal podes entrar
Zeca Preto
Sou fruta de vez no teu pomar
Toma logo esse açaí mata a vontade
Devora esses olhos castanhos do Pará.
Sou paisagem da lembrança
Zeca Preto
Sou Saci dessa maloca
Vem jogar conversa dentro
Vem provar dessa paçoca.
Sorrio apenas o necessário
Zeca Preto
Para que o sorriso não seja apenas um escancarar de boca
Boca que seduz, assobia, devora,chupa que beija
Boca que poeta,encanta, canta e não cala.
Água distanciando do porto
Zeca Preto
Da beira à água
Caminhadas desenham
O desejo do rio.
Hoje eu não posso sair
Zeca Preto
Tô regando meu pé de música
Tô devorando uma cuia de acordes
Tô com cara de nova canção.
Vou batendo pilão na cadência desse carimbó
Zeca Preto
Anunciando aos meus guias os segredos dos tajás
Chamando os curupiras sonhadores da Amazônia
Pra essa festa danada de boa que é marabaixo.
Esterqueira,
Zeca Preto
Acúmulo de idéias liquidificadas
Na cabeça do arrogante homem da lei.
Extravasa o pudor vadio
Zeca Preto
Da sinhá donzela
Que corroída geme de amor
Ao levar no céu azul
O mastro da liberdade.
Sarabatana flechou coração do cantador da aldeia
Zeca Preto
Que vive apaixonado fazendo poemas pro rio
E passa o dia contemplando seu pé de taperebá
Beijando bocas sonhadoras que vem lá do Amapá
O teu importante rio chamado Branco
Zeca Preto
Sem preconceito em um Negro ele aflui
Hoje o meu quintal amanheceu lilás
Zeca Preto
Da cor do amor fugaz, da cor da sedução
Hoje as flores se abriram e choveu pétalas no chão
Fizeram do meu canto a cor forte da emoção
Ainda é tempo de jambo.
Sou o Zequinha daqui mesmo da redondeza
Zeca Preto
Que de vez em quando acerta o rumo deslumbrante do show
E se propaga também nos refletores opacos da mediocridade.
Eis-me aqui
Zeca Preto
Carne dada aos vermes
Sem arrependimentos
Dormindo nos meus culposos desejos
Sonhando com carícias impróprias.