O que chamamos de real é o nosso relacionamento com os outros, a experiência comum, a vida partilhada. A essa fase de nossa mente denominamos de consciência.
Valter da Rosa Borges
O sonho é, também, um tipo de consciência que não resulta inteiramente das nossas relações com o mundo exterior.
A consciência vigílica nos dá o ser social. A consciência onírica nos dá um ser ina-
preensível pelos padrões da consciência vígil.
O que é a alucinação, senão um conteúdo onírico objetivado? O sonho não é apenas a explicação simbólica dos nossos recalques: é uma atividade autônoma da mente.
Não será a loucura um sonho de que não se acorda? Um sonho com a aparência de vigília? Os hipnotizados também dão a impressão de que estar conscientes das coisas que os rodeiam.
Vigília é a vida psíquica seletiva. O sonho, parece-nos, é vida psíquica total. O fluxo psíquico entre as mentes parece incessante e a vigília nada mais é do que uma interrupção desse fluxo. O nosso eu é uma perturbação desse processo psíquico total.
Observou-se que o estado de plena vigília não dura mais que um minuto ou dois por hora. Assim, as nossas distrações ou "fugas" da realidade externa são mais freqüentes do que pensamos. Há pessoas que, por deficiência da censura ou controle do ego, permanece, por tempo muito longo, no mundo do sonho. A sua vida vigílica se torna, assim, um hiato no seu universo onírico.
Há um universo psíquico paralelo ao universo físico. Uma forma de percepção que não recolhe seu material do mundo físico, embora manipule com os dados desse universo. Contudo, as experiências do mundo psíquico nem sempre coincidem com as do mundo físico. Há um outro eu, movimentando situações e pessoas que não conhecemos na vida vigílica.
O que Deus faz,
Valter da Rosa Borges
faz a Si mesmo,
porque tudo é Ele.
O que é o vento senão
Valter da Rosa Borges
o vazio em movimento?!
O que é o espaço senão
o vazio parado?!
O que é um borrão
Valter da Rosa Borges
senão uma forma sem nome.
Não tem certidão geométrica.
É uma forma sem forma.
Um transgressor chamado amorfo.
Mas, acontece que a vida
é cheia de borrões
e não dos entes geométricos,
que o homem inventou.
O que fazemos no mundo?
Valter da Rosa Borges
O que o mundo nos faz?
O que nós fazemos juntos
(nós e o mundo), um mesmo nó
numa ciranda sem fim?
Como saber a ação,
que iniciou o universo
e seu cósmico bailado?
Se o movimento é eterno,
quem pode parar os átomos
e imobilizar as galáxias?
O que não serve para nós
Valter da Rosa Borges
apenas não nos serve.
Quem percebe
a totalidade
sabe que nada é inútil,
e que as coisas existem
sem explicação.
Se tudo tem um sentido,
qual o sentido do homem,
da flor, da pulga, da estrela?
O que será do guerreiro
Valter da Rosa Borges
se ninguém quiser lutar?!
O saber confere erudição. Mas só a compreensão transforma o vasto saber em sabedoria.
Valter da Rosa Borges
O sábio, quanto mais sabe, mais se isola. A sua convivência com as outras pessoas é sempre superficial. Porém isso não o torna um misantropo. Pelo contrário: ele é afável com as pessoas, mas só se relaciona com elas em assuntos triviais. Embora acostumado às profundezas, ele sabe, nos momentos necessários, subir à superfície e até mesmo divertir-se com as pessoas comuns.
Valter da Rosa Borges
O real nos parece um fluxo e no fluxo não há modelos. Daí, a eterna controvérsia dos que admitem, como Heráclito, que o fluxo ou devir é a realidade e dos que entendem, como Parmênides, que o real é imutável e o devir é aparência. Os modelos, portanto, são nossas formas perceptuais e transitórias de apreender, a cada momento, o fluxo. Assim, cada forma perceptual do fluxo só é real em relação ao percebedor no momento da percepção e só se torna aparência ou Maya se prossegue além da percepção.
Valter da Rosa Borges
O real é o agora. O agora é sempre inédito. Quem vê, não precisa de palavras, pois só se fala para aqueles que não viram. E o que se diz, já não é: o presente é mais rápido que o laço da palavra. Por isso, quem fala, não vê, porque, se fala, fala do que já não vê. O eu não existe no presente: surge, quando a experiência já terminou. O eu é o passado.
Cada percepção do real é única e irrepetível. Jamais saberemos o que perdemos, ja-
mais repetiremos o que experimentamos. A riqueza do viver não consiste na acumulação do vivido, mas na capacidade de viver plenamente o momento que passa. Nenhuma experiência deve deixar restos ou saldos, pois eles deformam as novas percepções da realidade.
O sempre e o nunca são criações do homem desejoso de impor leis à natureza.
Valter da Rosa Borges
O silêncio também é voz.
Valter da Rosa Borges
É aquilo que não foi dito,
porque, se dito, era pouco.
O silêncio não se mede
pela medida da frase.
Excede qualquer semântica.
Não é dicionarizável.
No princípio era o verbo,
mas antes dele o silêncio,
anterior ao princípio.
O sol de fim de tarde pouco aquece.
Valter da Rosa Borges
Em tudo sopra uma saudade fria.
Recolho os sonhos e recolho os fatos:
todos serão iguais no anoitecer.
O Sol Escaldante Que Queima Minha Pele
Wesley Paneto Rosa
Nao Consegue Aquecer Meu Corpo
Dominado Pela Escuridão Congelante de Minha Alma.
O sonho é o nosso modo
Valter da Rosa Borges
de caminhar sem o corpo.
O corpo pouco nos leva:
somos nós que o arrastamos.
Queremos ver mais que os olhos,
ouvir mais que os ouvidos,
e exercer a onipresença,
em qualquer lugar do mundo.
O sonho morre quando vira fato.
Valter da Rosa Borges
O que foi fato se transforma em sonho.
O sonho nunca morre enquanto é sonho.
O fato morre em seu acontecer.
O tempo é a eternidade
Valter da Rosa Borges
que se perdeu de si mesma.
O tempo nem sempre apaga
Valter da Rosa Borges
as nódoas do já vivido,
principalmente o sofrido
e as fundas marcas do amado.
O tempo vazio.
Valter da Rosa Borges
O espaço vazio.
O coração vazio.
Um oco que não tem fim.
A solidão sem fronteiras.
Um silêncio surdo-mudo
é testemunha do nada.
O vazio não é
Valter da Rosa Borges
a ausência de Deus,
mas a Sua invisibilidade.
O vazio, alma da forma.
Valter da Rosa Borges
O vazio é qualquer forma.
A alma é o vazio,
que cria todas as formas.
O vento sabe todos os caminhos,
Valter da Rosa Borges
mas não deixa seus rastros nas areias.
O vento sopra impetuoso,
Valter da Rosa Borges
vergando a copa das árvores.
As folhas caem no chão:
folhas secas, folhas verdes.
Por que não somente as secas?
O verdadeiro mago é quem faz de sua vida um contínuo encantamento.
Valter da Rosa Borges
Odeia-se aquele que é livre,
Valter da Rosa Borges
porque perturba o descanso
das pessoas rotineiras.
O louco é insuportável,
porque vive perdido
na liberdade total.